Artigos de saúde

Saúde Mental na Infância e Adolescência

Neste Artigo:

- Da Normalidade à Psicose
- A Criança Psicótica e sua Família

A visão multidisciplinar para o diagnóstico e tratamento dos problemas de saúde mental na infância e adolescência foi tema de Simpósio em São Paulo. O professor italiano Carmine Saccu falou aos profissionais de saúde mental sobre a psicose na infância e adolescência, os limites da normalidade e o relacionamento familiar do psicótico.

Uma das tarefas mais complicadas e importantes para quem trabalha com saúde mental da criança e do adolescente é acertar no diagnóstico. Diferenciar uma criança psicótica de uma neurótica, por exemplo, determina a forma de tratá-la e as suas chances de inserção social. A importância, portanto, de tratar deste assunto junto aos profissionais da saúde mental se dá pela influência que um diagnóstico correto pode ter sobre o futuro de pacientes que estão em tenra fase do seu desenvolvimento. Os instrumentos e pesquisas que auxiliam os profissionais na determinação de um diagnóstico de um indivíduo, ainda não totalmente formado, seja psíquica ou fisicamente, ainda está em fase muito incipiente no mundo científico.

A partir deste quadro, em 18 e 19 de agosto último foi realizado em São Paulo, o IIº Simpósio Internacional de Saúde Mental da Infância e da Adolescência, que tratou do Diagnóstico Diferencial com uma visão multidisciplinar. A organização e sede do evento foram do Núcleo de Psicologia da Infância e Adolescência, do Setor de Psicologia do Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

O evento, liderado pela Dra. Wilze Laura Bruscato, Chefe do Setor de Psicologia da Santa Casa, contou com o nome internacional do Prof. Carmine Saccu, diretor do Serviço de Terapia Familiar do Instituto de Neuropsiquiatria Infantil da Universidade de Roma. Ele é membro fundador da Sociedade de Psicologia e Psicoterapia Relacional European Family Therapy e Membro do board 1994-1998 da FIAP – Federação Italiana das Associações de Psicoterapeutas, além de ser membro da EAP – Associação Européia de Psicoterapia. O Dr. Saccu tem ainda no seu currículo a fundação do Instituto de Terapia Familiar e da Escola Romana de Psicoterapia Familiar, de onde também foi diretor.

Da Normalidade à Psicose

O Prof. Saccu falou, principalmente, em suas duas conferências no primeiro dia do evento, da importância de definir, no diagnóstico da psicose, o ponto em que a criança se encontra na sua relação com o "Tempo" em que vivemos. O Professor traçou, em sua aula, uma pirâmide de múltiplos degraus, em referência metafórica à mitologia Maia, que vai do topo, onde o tempo parou para o indivíduo e que ele é, portanto, diagnosticado como psicótico, até a base, em que o seu tempo é tão acelerado que ele só sabe viver no futuro, o que o diagnostica como neurótico. "Uma pessoa que está no tempo é previsível, mas se está fora, é imprevisível", sentencia o Dr. Saccu, que explica que os psicóticos agem como os sumo-sacerdotes da mitologia Maia: "Ele nega qualquer relacionamento, não pode falar na primeira pessoa, porque só vive pelos outros, não em relação aos outros". O Dr. Saccu explica que os "sumo-sacerdotes", assim como os psicóticos, têm um papel a cumprir dentro de suas famílias e comunidades, ao mesmo tempo em que as fazem girar em torno de si.

A Criança Psicótica e sua Família

Ele defendeu, ainda, a importância de trabalhar-se toda a família no processo de psicoterapia, tendo em vista que um psicótico estabelece um papel na sua relação familiar, em que é o centro de todas as atenções e demanda energia de todos os membros da sua família. De acordo com o Prof. Saccu, as mães de crianças psicóticas costumam dedicar-se exclusivamente ao seu filho, em detrimento do restante da família e de sua própria vida pessoal. É comum, nestes casos, que o profissional que trabalha com uma família psicótica tente separar o filho da mãe, para que este crie outros relacionamentos. Mas é impossível, segundo o especialista, estabelecer um relacionamento entre terapeuta e paciente psicótico e isolar a mãe: na experiência do Dr. Saccu, quando isso acontece e a mãe não recebe também um tratamento, ela passa a sentir um vazio tão grande na sua vida que tende a interromper a terapia do filho, que exerce, como já dito, um papel importante na família, de centro de todas as atenções e energias. "Uma solução é estabelecer uma terapia familiar, visando restabelecer o papel de cada um neste grupo", diz.

De acordo com o Dr. Saccu, nesta pirâmide imaginária que representa o ritmo do Tempo, os normais se situam como os que possuem mobilidade e não vêem as coisas como parciais, mas possui uma visão global. Ele não é nem o neurótico, que nunca consegue viver o presente e está sempre ansioso pelo futuro, nem o psicótico, que vive como Adão e Eva no Paraíso, sem limites temporais. O papel do profissional, no caso do psicótico, é trazê-lo para o Tempo, mas esta é uma tarefa difícil, uma vez que fazê-lo sair do paraíso é também fazê-lo abandonar o papel, a missão, que tem junto a sua família. O psicótico, segundo o Dr. Saccu, é um ser extremamente sensível, que responde a uma demanda familiar. "Existem famílias e mães psicotizantes, que quando percebem um retorno ao Tempo dito normal por parte dos seus filhos, não suportam o vazio deixado e tendem a chamá-los de volta ao seu papel", explica mais detalhadamente o Dr. Saccu.

O professor supervisionou ainda dois casos clínicos tratados por equipes multidisciplinares, um da própria Santa Casa e outro da PUC. Ele frisou a necessidade de todos os membros das equipes terem uma mesma visão sobre o seu paciente, tendo em vista que o próprio paciente utiliza as divergências entre os setores que o tratam para corresponder à diferentes expectativas e mobilizar todos em torno de si.

No segundo dia do evento, a foram realizadas ainda uma série de palestras e mesas redondas, tratando dos temas "A ausência de estudos e pesquisas sobre diagnóstico em saúde mental da infância e da adolescência", "Desenvolvimento e transtornos psiquiátricos na infância e na adolescência", "O processo diagnóstico e seus instrumentos", "O diagnóstico multidisciplinar dos transtornos psíquicos graves na infância e adolescência", "Implicações do diagnóstico em saúde mental na rotina e no futuro da criança e do adolescente" e, por último, "O diagnóstico multidisciplinar como fonte de pesquisa".

Copyright © 2000 eHealth Latin America    25 de agosto de 2000