Artigos de saúde
A demência é uma síndrome de disfunção adquirida em vários domínios da função intelectual, incluindo a memória, a linguagem, a capacidade visual-espacial e a cognição (abstração, matemática, julgamento, e solução de problemas).
Os distúrbios de humor e as alterações na personalidade e no comportamento freqüentemente acompanham a deterioração intelectual. A demência resulta de uma ampla variedade de condições, incluindo distúrbios degenerativos (doença de Alzheimer), processos vasculares, neoplasias, infecções, processos inflamatórios, distúrbios tóxicos e metabólicos e, por fim, distúrbios psiquiátricos.
O estabelecimento da demência pode ser abrupto, devido a um trauma ou a um derrame, mas é mais freqüentemente um processo gradativo. Embora a maioria das doenças que levam à demência seja progressiva, em alguns casos o seu curso pode ser modificado por intervenções terapêuticas apropriadas. Apesar da identificação precisa da causa da demência e do fornecimento de tratamento sintomático (pois é uma doença sem cura), os pacientes afetados sofrem tipicamente de um comprometimento acentuado e progressivo da sua função social e ocupacional. O custo econômico, social e psicológico das doenças que levam à demência é assustador para os pacientes e para a família.
A demência em pessoas adultas é uma preocupação crescente em saúde pública. Embora os números variem, existe um consenso de que a incidência desta aumenta com o avanço da idade. Estudos recentes sugerem que 3% da população entre as idades de 65 a 74 anos podem apresentar a doença de Alzheimer (a causa mais comum de demência). Este número aumenta para 19% em pacientes com idade de 75 a 84 anos, chegando a até 50% em pacientes acima de 85 anos. O gasto com o tratamento desses pacientes é estimado em aproximadamente 40 bilhões de dólares por ano.
A rápida expansão do número de pacientes dementes na população e o alto custo de seu tratamento trás sérias preocupações para as pessoas envolvidas no planejamento da saúde. Questões a serem resolvidas incluem a escolha de testes diagnósticos com melhor eficácia por menor custo possível, a avaliação de rotina da deterioração intelectual - selecionado a terapia e as estratégias de tratamento mais eficazes, e o planejamento do tratamento, em longo prazo, mais humano e responsável.
A recomendação para o tratamento da demência é um tema amplamente discutido e trás grandes controvérsias, principalmente, na faze terminal da doença. Tentando analisar qual seria a melhor conduta diante de pacientes com quadro grave de demência, Morrison e Siu, pesquisadores dos Estados Unidos, conduziram um estudo com o objetivo de fazer uma investigação das taxas de mortalidade e dos tipos de tratamentos para a demência severa, comparando esses resultados com os obtidos em pessoas normais. Este estudo foi publicado na revista JAMA de junho de 2000 e foi comentado pelo Dr. Don Riesenberg nessa mesma edição.
O estudo
Morrison e Siu compararam as taxa de mortalidade e o tratamento recebido pelos pacientes com estado avançado de demência com as taxas e o tratamento em pacientes sem alterações do estado mental. Todos os pacientes estudados, com ou sem demência, apresentavam fratura de quadril ou pneumonia.
Os autores mostraram que a demência por si só, estava associada com um aumento das taxas de mortalidade. Para aqueles pacientes com demência e pneumonia a taxa de mortalidade foi de 53%, em 6 meses, enquanto que nos pacientes normais com pneumonia a taxa foi de 13%. Para aqueles pacientes com demência e fratura de quadril a taxa de mortalidade foi de 55% e a taxa entre os pacientes normais com fratura de quadril foi de 12%.
Eles observaram também que os pacientes dementes com fratura de quadril receberam uma quantidade muito menor de morfina, para o controle da dor, do que os pacientes com o estado mental preservado. Eles acreditam que isso tenha ocorrido, principalmente, devido ao fato dos pacientes com demência não conseguirem expressar a sua dor. Mas alguns médicos não prescreveram a droga por medo dela aumentar a incidência de delírio e alucinações.
O uso de derivados opióides em pacientes idosos e frágeis é muito discutível, visto que existe uma tendência em afirmar que o uso dessas drogas pode promover uma deterioração do estado respiratório desses indivíduos. Mas não há nenhum substrato fisiológico aparente que justifique essa tendência.
Em relação aos procedimentos invasivos, os autores não encontraram nenhuma diferença significativa entre os dois grupos, sendo que apenas o cateterismo vesical foi mais usado nos pacientes demenciados, isso se explica pela própria evolução da doença que acaba levando à incontinência urinária.
Ao final do trabalho, os autores observaram que o tratamento intensivo, na maioria das vezes, só é estabelecido em faze final da doença, quando os pacientes não são mais capazes de participar das decisões a respeito dos procedimentos aos quais serão submetidos. E que muitas vezes, os mesmos já não entendem a finalidade dessas intervenções mais agressivas, que dessa forma são causas de maior sofrimento e ansiedade, chegando a agravar os quadros psiquiátricos.
Comentários
Segundo o Dr. Don Riesenberg, que comentou o artigo de Morrison e Siu, esse estudo trouxe importantes questões a respeito dos cuidados intensivos nos pacientes em faze terminal de demência. Ele acredita que o tratamento e todos os procedimentos aos quais os pacientes serão submetidos devem ser discutidos com cada paciente e com a família, antes da doença se agravar. E acredita, também, que os pacientes devem sempre saber a verdade e que o médico tem o dever de mantê-los informados a respeito da doença e da sua evolução.
Finalmente, o Dr. Don pensa que o tratamento avançado em hospitais deve ser iniciado antes da progressão da doença e antes que condições como a pneumonia ou a fratura do quadril possa ocorrer. Ele acha que essa decisão deve ser bem elaborada e que alguns minutos gastos com esses assuntos podem poupar muito sofrimento.
Fonte: JAMA – Vol. 284 No. 1, July 5, 2000.
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