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17 de Janeiro de 2001 (Bibliomed). A gravidez é uma intrigantes inconsistência imunológica, uma vez que o sistema de defesa da mãe deveria rejeitar o feto, um ser que contém proteínas "estranhas" do pai. Agora, nova pesquisa em camundongos revela como o corpo mantém o sistema de defesa da mãe distante do feto.
Parece que uma enzima, chamada indoleamina 2,3 dioxigenase (IDO), participa na complexa tarefa de minimizar a ação do sistema de defesa contra o feto durante a gravidez.
A nova informação pode ajudar médicos a entender como tratar melhor mulheres que tiveram vários abortos espontâneos, além de dar uma maior compreensão sobre a rejeição de órgãos transplantados, segundo um estudo publicado em janeiro na revista "Nature Immunology". "Mamíferos apresentam um intrigante paradoxo imunológico", disse Andrew Mellor, do Instituto de Medicina Molecular e Genética da Faculdade de Medicina da Geórgia, nos EUA.
"O feto deveria ser rejeitado pelo sistema imunológico da mãe, pois ele herda genes do pai que codificam proteínas que deveriam ser reconhecidas como estranhas pelo sistema de defesa da mãe", explicou Mellor. "Isso sugere que, durante a evolução, os mamíferos desenvolveram mecanismos que protegem o feto da resposta imunológica materna."
O IDO suprime o sistema de defesa que iria provocar inflamação e sangramento na região de contato entre a mãe e o feto -- a região onde os processos celulares e moleculares alimentam e protegem o feto em desenvolvimento. Mellor e colegas descobriram que ao inibir a enzima IDO em camundongas grávidas a gestação era interrompida. Os pesquisadores encontraram sinais de sangramento e inflamação, evidência de sistema imunológico ativo e de rejeição do feto.
E mais. Gravidez em que a mãe e o feto eram muito diferentes geneticamente foi interrompida mais cedo, mas gestações em que a mãe e o feto tinham o genoma muito parecido não foram afetada, independentemente da supressão da enzima IDO.
"Quanto maior a diferença (entre a mãe e o feto), maior o risco de o feto ser rejeitado em nossos modelos animais", afirmou Mellor. "Isso ocorre por causa das diferenças entre os genes maternos e paternos."
Mellor acredita que inibir a IDO não é o sinal para o sistema imunológico agir, mas aumenta as chances de rejeição fetal porque abre a possibilidade de o sistema de defesa reconhecer a "incompatibilidade de tecido", da mesma forma que ocorre num transplante de órgãos.
"O risco de rejeição fetal é maior quando os tipos de tecido dos pais são mais distantes e a barreira protetora do IDO é removida", Mellor explicou. "Essa não é uma grande surpresa, mas enfatiza que o feto é um tecido estranho. Essa descoberta pode ser relevante para mulheres que tiveram vários abortos espontâneos. A causa pode ser imunológica."
Avalia-se que 50% das gestações não são bem-sucedidas por causa de complicações que surgem depois que as células fetais se implantam no útero. Altos níveis de incompatibilidade entre o tecido materno e paterno podem ser responsáveis por algumas gestações interrompidas logo depois que o embrião se fixa no útero e que não apresentam problema de desenvolvimento ou causa genética.
Essa descoberta alimenta a esperança de que novos tratamentos contra o aborto espontâneo em humanos serão desenvolvidos. "Embora seja especulativo, pois conduzimos nossos estudos em ratos, os resultados sugerem que pode haver uma razão para o mecanismo da enzima IDO que protege o feto ser defeituoso ou ineficiente de alguma forma nessas pacientes", Mellor disse à Reuters Health.
"Nossos dados sugerem que o feto humano com maior risco de ser abortado espontaneamente é aquele que apresenta uma maior incompatibilidade de tecidos entre o pai e a mãe", ele acrescentou. Se uma deficiência de IDO acaba sendo responsável por alguns casos de aborto espontâneo freqüente em humanos, pode ser possível que, algum dia, se prescreva IDO para ajudar as mães a tolerarem melhor o feto.
Mas o trabalho de Mellor também sugere aplicações além da gravidez -- de transplante de órgãos até HIV e câncer. "Acreditamos que as nossas descobertas terão implicações maiores para melhorar o resultado de transplantes de tecido, já que os mamíferos solucionaram esse problema quando o seu mecanismo de proteção do feto evoluiu", Mellor assinalou.
"Há também razão para pensar que alguns agentes infecciosos, como o HIV, o vírus que causa Aids, pode se apoderar do mecanismo da enzima IDO para escapar do nossos sistema de defesa, da mesma forma que o feto. Isso pode se aplicar também a tumores, que várias vezes são resistentes ao ataque do sistema de defesa", disse.
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