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A Criança Frente à Morte

Em termos gerais, em todo o mundo, a atual crise social, familiar, econômica e moral está incidindo desfavoravelmente no comportamento dos adolescentes, que ao não encontrarem valores e sentido na sua vida, buscam o suicídio como solução.

Ainda que não seja fácil prever com certeza a conduta futura de uma criança, os especialistas aconselham a não subestimar suas ameaças ou advertências. A idealização ou intenção do suicídio como uma busca voluntária da perda da vida começa com a pré-adolescência e adolescência e freqüentemente surge de um estado depressivo.

É difícil falar a respeito da intenção de suicídio com as crianças que ao redor dos seis anos de idade estão recém começando a elaborar um conceito rudimentar sobre o que é a morte.

Uma criança com menos de 5 anos ainda não entende as três definições fundamentais da morte que são: a morte é irreversível, definitiva e permanente; caracteriza-se pela ausência das funções vitais; a morte é universal (todos morreremos).

É por isso que consideram a morte um estado temporal como estar dormindo ou andando, em que os defuntos ainda podem escutar-nos ou ver-nos ou que eles ou seus pais nunca irão morrer. “Entretanto há crianças com acidentes freqüentes, nas quais atua uma intenção suicida inconsciente, como por exemplo atravessar a rua sem olhar, não medir os riscos de determinadas situações, expor-se a violência”, assinala a Dra. Márcia Braier, psiquiatra infanto-juvenil, chefe da seção de docência do Hospital Carolina Tobar Garcia, na Argentina.

Investigações do Hospital Baca Ortiz, na Espanha, indicam que o nível mundial da idade do suicida está baixando. Nos Estados Unidos a conduta auto-destrutiva e suicida em adolescentes é um dos maiores problemas de saúde pública, e triplicou entre 1950 e 1980.

Segundo dados da “American Academy of Child and Adolescent Psychiatry” (AACAP), o suicídio entre os adolescentes nos Estados Unidos teve um drástico aumento recentemente, a cada ano milhares de adolescentes suicidam-se neste país. O suicídio é a terceira causa de morte mais freqüente para jovens entre 15 e 24 anos de idade, e a sexta causa de morte para a faixa etária de 5 a 14 anos.

Um estudo realizado no Serviço de Internação do Hospital Infanto Juvenil Dra. Carolina Tobar Garcia durante o período 1997-1999, detectou um acréscimo de 50% nas tentativas de suicídio. Avaliaram-se 78 pacientes de ambos os sexos, entre 12 e 18 anos de idade e cuja a causa da internação foram intenção ou tentativa de suicídio, estes pacientes constituiram 25% das internações neste período.

Os fatores de riscos

Os fatores de risco tanto de patologias psiquiátricas como intenção ou tentativa de suicídio são múltiplas, e variam de acordo com a pré-disposição genética e com o entorno social.

Os fatores recorrentes são: desordens afetivas, sociopatias, drogas, álcool, transtornos de conduta, stress prolongado, perdas, abuso físico ou sexual, processo escolar, famílias caóticas, alcoólicas e conflitivas, e muito freqüentemente a depressão. Além disso, segundo alguns autores existem também fatores genéticos e biológicos, na maioria dos casos se somam dois ou três fatores. O maltrato físico e o abuso sexual precipitam a intenção suicida.

Para o professor de Psicopatologia da Universidade Complutense de Madrid, Javier de Las Heras, os principais fatores que explicam as condutas auto-lesivas são: o maior número de famílias desestruturadas, a diminuição da comunicação familiar, o aumento dos conflitos no ambiente em que vive a criança e o excesso de competividade refletido no fracasso escolar.

Segundo De Las Heras, os últimos estudos realizados sobre amostras da população infantil menor de 14 anos, demonstram que 8% das crianças sofrem de depressão na atualidade, e o principal risco para uma pessoa deprimida, seja uma criança ou um adulto, é o suicídio. Para o especialista uma das condutas que podem ser reflexo de uma depressão em um menor são aquelas que supõem violência e agressividade, uma vez que as crianças não manifestam a tristeza ao estarem deprimidas, apenas modificam suas condutas.

Outro estudo realizado sobre pacientes infanto-juvenis com tentativa de suicídio no Hospital Eugenio Espejo, na Espanha, revelou os seguintes traços de personalidade: ansiedade, timidez, baixa auto-estima, imaturidade emocional, necessidade de afeto, dependência, rebeldia, teimosia, impulsividade, retraimento, depressão, hostilidade, irritabilidade e agressividade.

Na Argentina, os profissionais responsáveis pela investigação do Hospital Tobar Garcia (Dr. Roberto Yunes, Dra. Márcia Braier, Dra. Silvina Gerra e a enfermeira María Teresa López Quirque), descobriram que a psicopatologia de base na intenção ou tentativa de suicídio, foi a depressão nos homens e os transtornos de ansiedade nas mulheres.

Os fatores de risco foram: a falta de escolaridade, o desemprego dos pais e a falta de moradia. Mencionaram também como outros fatores de risco a violência familiar, a separação dos pais, consumo de drogas, crianças orfãns, famílias desestruturadas, fugas, temperamento triste ou agressivo e tentativa de suicídio na infância, pobreza.

Quanto os métodos das tentativas, foram diferentes entre homens e mulheres: nas mulheres predominou o ímpeto na direção e a ingestão de medicamentos, e nos homens, o uso de arma branca, ingestão de medicamentos e tentativa de enforcamento, entre outros.

Intervir a tempo e perceber as advertências

A depressão e as tendências suicidas são desordens mentais que podem ser tratadas. É necessário reconhecer e diagnosticar a presença destas condições tanto nas crianças como no adolescente, e desenvolver um plano de tratamento. Quando os pais suspeitarem que a criança ou o jovem pode ter um problema sério, um exame psiquiátrico pode ser de grande ajuda.

Muitos dos sintomas das tendências suicidas são similares aos da depressão. Os psiquiatras de crianças e adolescentes recomendam que se o jovem apresenta um ou mais destes sintomas, os pais devem falar com seu filho sobre sua preocupação e buscar ajuda profissional se os sintomas persistirem. A AACAP aconselha aos pais estarem atentos aos seguintes sinais que podem indicar que o adolescente está pensando em suicídio:

· Mudanças nos hábitos de dormir e de comer
· Retraimento com os amigos, com a família ou com suas atividades habituais
· Atitudes violentas, comportamento rebelde ou fuga de casa
· Uso de drogas e de álcool
· Descuido com a aparência pessoal
· Mudanças exageradas em sua personalidade
· Tédio constante, dificuldade de concentração, ou queda na qualidade de seu trabalho escolar
· Queixas freqüêntes de dores físicas tais como dores de cabeça, de estômago e fadiga, que estão em geral associados com o estado emocional do jovem
· Perda de interesse em seus passatempos e outras distrações
· Pouca tolerância a elogios ou prêmios

O adolescente que está pensando em suicídio também pode:

· Queixar-se de ser “mau” ou sentir-se “abominável”
· Lançar indiretas como: “não seguirei sendo um problema para você ”, “nada me importa”, “para que incomodar-se” ou “não te verei outra vez”
· Colocar em ordem seus assuntos; por exemplo: presentear com suas coisas favoritas, limpar seu quarto, jogar fora papéis ou coisas importantes, etc
· Ficar muito contente após um período de depressão

O que se deve fazer se os pais e outros estão inquietos ou preocupados?

Quando uma criança faz uma ameaça séria, deve ser tratada como tal. Pais, professores e outros adultos devem falar de imediato com a criança que está em perigo, e se ela nega-se a falar, argumenta, responde de forma defensiva, ou continua expressando pensamentos e planos perigosos, deve-se organizar uma avaliação imediata com um professional da saúde mental que tenha experiência com crianças e adolescentes.

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