Artigos de saúde
Dra. Patricia Daza Rueda
A esterilidade é uma incapacidade temporária ou definitiva de um casal em conceber
após um ano de relações sexuais sem controle contraceptivo voluntário. Para incluir-se
um casal num protocolo de cuidados da esterilidade, tal casal deve ter tido uma
exposição adequada à gravidez durante um ano.
A esterilidade primária se dá quando o casal não conseguiu uma gravidez e a
esterilidade secundária ocorre quando o casal tem antecedentes de uma ou várias
gestações, sendo que após um ano de exposição não conseguem conceber. A esterilidade
primária significa nunca ter havido concepção. Para os anglo-saxões esta situação
recebe o nome de infertilidade primária. Caso exista o antecedente de uma gravidez, a
esterilidade será secundária e corresponderá ao término da infertilidade secundária
na denominação anglo-saxã.
Talvez o estudo mais completo das causas desta patologia seja o que foi realizado pela OMS
na década de 80, em 33 centros de 25 países diferentes (desenvolvidos e em
desenvolvimento), abrangendo 5.800 casais inférteis. Chegaram a várias conclusões,
algumas das quais são citadas a seguir.
Dentre os fatores avaliados no estudo do casal infértil inclui-se:
a) Na mulher:
1. Fator cervical
2. Fator uterino corporal
3. Fator tubo-peritoneal
4. Fator ovariano (endócrino)
b) No homem:
5. Fator masculino
c) Em ambos:
6. Fatores associados ao coito
1 - Fator Cervical
Investiga mudanças anatômicas e de posição do cérvix, as características do
muco, a permeabilidade à passagem do esperma e alterações do mecanismo de migração
espermática. Avalia-se mediante exame ginecológico, estudo do muco cervical e provas
funcionais "in vivo" (pós-coito ou de Sims Huhner) ou "in vitro"
(Kremer ou prova de muco-sêmem). O estudo de muco cervical (cristalização,
consistência, etc) é efetuado antes ou durante a ovulação.
O teste pós-coito avalia as modificações que ocorrem no contato do sêmem com o muco
cervical e o grau de penetrabilidade do espermatozóide.
2 - Fator Uterino Corporal
O útero é fundamental para a reprodução porque deste órgão dependem o transporte
espermático, a implantação do feto, seu desenvolvimento e o parto. O espermatozóide
avança tanto pela sua mobilidade intrínseca quanto pelo impulso que obtém das
contrações uterinas, que obedecem ao orgasmo e às prostaglandinas presentes no líquido
seminal e que são absorvidos a partir da vagina. O líquido seminal, em contato com o
endométrio, sofre mudanças que favorecem e o habilitam para a fecundação e o trânsito
para o oviduto.
A implantação não ocorre se não houver um endométrio preparado pelos estrógenos e
pela progesterona até um certo grau de maturação que permita a nidação. A presença
de alterações anatômicas uterinas pode ser causa de aborto repetido ou esterilidade.
O fator uterino-corporal é estudado mediante o exame ginecológico, histerometria,
biópsia de endométrio, ecografia, histerografia, histerossonografia, laparoscopia e
histeroscopia.
3 - Fator Tubo-Peritoneal
O papel do oviduto não se resume ao de um simples local de trânsito para o óvulo e
espermatozóide. Sua participação no transporte dos gametas é ativa, da mesma forma que
na nutrição e desenvolvimento do embrião nos primeiros dias.
Uma análise avaliaria desde o espaço tubo-ovárico, a trompa, a passagem, a mobilidade
das fimbrias, o pavilhão e a trompa, investigando também alterações que dificultem a
capacidade de ovulação.
Pode-se realizar esta exploração por meio de radiologia (histerosalpingografia com
contraste) ou cirurgia. A laparoscopia tem mostrado-se o método mais seguro para avaliar
a anatomia do oviduto, permitindo-nos observar diretamente o fluxo de azul de metileno
pela cavidade peritoneal logo em seguida após ser injetado pelo orifício cervical
(laparoscopia e cromotubação). Ainda que a histerosalpingografia mostre a luz das
trompas, não existe método que avalie as condições da mucosa tubária. Os
procedimentos são complementares e seqüenciais na análise do oviduto e do espaço
tudo-ovárico.
A endometriose e as aderências peri-tubáricas só podem ser diagnosticadas pela
endoscopia. A histerossonografia é um novo aporte ao estudo da permeabilidade tubária.
O estudo da OMS demonstrou que os diagnósticos relacionados com infecção e oclusão
tubária bilateral eram fatores realmente importantes entre as pacientes com infertilidade
no mundo inteiro. Em até 64% das pacientes africanas e 28 a 35% das pacientes de outras
regiões do mundo a infertilidade pode ser atribuída a uma história de infecção
prévia como doença inflamatória pélvica (DIP), doença sexualmente transmissível e
complicações infecciosas no aborto, gravidez ou parto normal.
Anteriormente, Westrom, na Suécia, havia descoberto que a infertilidade, depois de uma
DIP, desenvolvia-se em 6 a 60% das pacientes de acordo com a gravidade da infecção, o
número de infecções e a idade no momento da infecção inicial. Os estudos
subseqüentes contribuíram de maneira crescente e contínua no aumento da importância da
infecção como causa de infertilidade. Segundo Cates et Alli, do CDC dos Estados Unidos,
diante de um único episódio de DIP, cerca de 12% das pacientes apresentará
infertilidade, após 2 episódios, 25% será infértil e depois de 3 ou mais episódios,
mais de 50% apresentará este problema.
A infecção pélvica não está relacionada apenas com a infertilidade. Também há
relação com a gravidez ectópica, relação esta que tem sido provada concludentemente
cada vez mais. As lesões como aderências pélvicas ou sub-oclusão tubária podem
permitir a fecundação, mas impedem o progresso do embrião pela cavidade uterina ficando
este preso no oviduto.
É importante estudar a relação existente entre a infecção pélvica, a gravidez
ectópica e a infertilidade, uma vez que a OMS estima que a taxa de infertilidade é de
50% para as pacientes depois da gravidez ectópica e 10% destas pacientes após
apresentarem este quadro voltaram a apresentá-lo posteriormente.
O lamentável neste fato é que a esterilidade de origem infecciosa é totalmente
passível de prevenção.
4 - Fator Endócrino Ovariano
30% das mulheres estéreis apresentam transtornos na ovulação. Estas alterações
constituem um quadro complexo que foi classificado pela OMS (Organização Mundial de
Saúde) da seguinte maneira:
Grupo I. Falha do eixo hipotálamo-hipófise, pacientes com amenorréia e baixa
produção de estrógenos, com valores de FSH e prolactina normais ou baixos e sem lesões
evidentes na área do hipotálamo-hipófise.
Grupo II. Alteração hipotálamo-hipófise em pacientes com diversos transtornos
do ciclo ovário que incluem insuficiência lútea, falta de ovulação e amenorréia com
baixa produção de estrógenos e FSH normal ou baixa.
Grupo III. Paciente com falha ovariana primária ou secundária.
Grupo IV. Pacientes nas quais não se consegue induzir desenvolvimento endometrial
mediante a administração de estrógenos e progesterona.
Grupo V. Pacientes com hiperprolactinemia e evidência de lesão na área do
hipotálamo-hipófise comprometendo a função de órgãos adjacentes.
Grupo VI. Pacientes com hiperprolactinemia sem lesão evidente na área do
hipotálamo-hipófise.
Grupo VII. Mulheres com amenorréia e lesão evidente na área do
hipotálamo-hipófise e valores normais ou baixos de gonadotrofinas, prolactina e
estrógenos.
Recentemente, investigou-se a importância do período da foliculogênese para o
desenvolvimento do corpo lúteo assim como o papel dos andrógenos no processo de atresia
do mesmo. Ainda não foi possível estudar o interior do folículo nem a seqüência de
mudanças hormonais devido ao fato de que a avaliação do fator ovariano é realizada de
acordo com a presença ou não de ovulação e a formação de um corpo lúteo com tempo
normal de secreção e níveis hormonais adequados.
Os únicos parâmetros seguros para a ovulação são a gravidez ou a recuperação do
óvulo no oviduto.
Os métodos em uso atualmente são indiretos e muitos deles perderam bastante da antiga
confiabilidade devido à incorporação das ultra-sonografias e das modernas técnicas de
determinação hormonal, por meio de radio-imunoanálise, muito mais exatas e seguras.
São elas:
O gráfico de temperatura basal (curva bifásica);
A observação do muco cervical (aumento da quantidade, consistência, cristalização
anterior à ovulação com decréscimo destes parâmetros após a liberação ovular);
Biópsia de endométrio (com modificações secretoras para a fase lútea):
Determinações de laboratório: LH com pico máximo na metade do ciclo e ovulação 24
horas após; progesterona plasmática com valores de 3ng/ml no dia 22-24 do ciclo, como
indicadores de ovulação. Observação direta através de laparoscopia.
5 - Factor Masculino
Avalia a capacidade de fertilização masculina e seu grau de normalidade. Inclui,
além do histórico e do exame andrológico, testes de laboratório e análise de sêmem.
O espermograma informa sobre o volume ejaculado, contagem espermática, mobilidade,
morfologia, quantificação de células redondas, bioquímica do plasma seminal e
presença ou ausência de processos infecciosos.
A coleta é feita diretamente num frasco de boca larga por meio de masturbação após
período de abstinência de 2 ou 3 dias. O material deve ser observado num prazo de duas
horas após a coleta.
Outros exames complementares incluem bacteriologia, cultura, imunologia, estudo genético,
radiologia das vias espermáticas e biópsia testicular.
6 - Fatores Relacionados ao Coito
Investiga a dinâmica da relação sexual no tocante à técnica de copulação
correta e ao depósito de sêmem na cavidade do colo uterino. Exige do homem um
desenvolvimento normal do pênis, ereção adequada e ejaculação na vagina
oportunamente. Na mulher são necessários um aparelho genital harmonicamente
desenvolvido, relaxamento e capacidade de recepção durante o coito.
Este fator é estudado através de interrogatório, exame clínico-ginecológico e teste
de inseminação pós-coito que revelaria espermatozóides na cavidade vaginal.
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