Artigos de saúde
A circuncisão é uma cirurgia realizada em milhões de recém-nascidos em todo o
mundo. Apesar das evidências de se tratar de um procedimento muito doloroso, ela ainda é
realizada, em alguns centros, sem a analgesia adequada.
O bloqueio do nervo dorsal do pênis (infiltração de anestésico no tecido subcutâneo
sobre este nervo) tem sido usado com êxito para o controle da dor. Outro procedimento
muito utilizado é a aplicação de pomadas anestésicas à base de lidocaína-prilocaína
(EMLA) no local da cirurgia. Um estudo recente, que comparava a ação desses dois
métodos de anestesia, evidenciou um melhor resultado com o bloqueio do nervo dorsal do
pênis. Outro método bastante utilizado para provocar um menor desconforto nas crianças
durante a cirurgia é o uso de uma gaze coberta de açúcar e embebida em suco de uva,
sobre a boca, para a criança sugar (o que mantém o recém-nascido calmo).
As intervenções combinadas têm se mostrado mais efetivas do que os procedimentos
isolados. Estudos realizados anteriormente demonstraram que a combinação do bloqueio do
nervo dorsal do pênis com a aplicação na boca da gaze embebida em suco de uva,
mostrou-se mais efetiva que o uso isoladamente do bloqueio. Da mesma forma, esses estudos
mostraram que procedimentos realizados com o emprego do EMLA associado com o uso da gaze
embebida em suco de uva causaram menos dor do que as cirurgias realizadas somente com o
uso da pomada anestésica.
Outro trabalho publicado recentemente evidenciou que a dor na circuncisão varia de acordo
com a técnica utilizada. Um dos principais objetivos do uso de analgésicos e
anestésicos durante um ato cirúrgico é a prevenção da dor, e para que essa meta seja
alcançada na circuncisão é necessário que mais estudos sejam realizados para a
avaliação do melhor método de anestesia e analgesia a ser empregado. Com essa
intenção um grupo de pesquisadores canadenses (do Departments of Pharmacy and
Paediatrics, The Hospital for Sick Children, Toronto, Ontário; the Pollock Clinics,
Vancouver, British Columbia; Department of Psycology, IWK Grace Health Centre, Halifax,
Nova Scotia) liderados pela Dr. Anna Taddio, conduziram um estudo no qual, eles analisaram
o efeito e a segurança do emprego da combinação de intervenções analgésicas
(incluindo a aplicação local do EMLA, o bloqueio do nervo dorsal do pênis, o emprego do
paracetamol e o uso da gaze embebida em suco de uva) no controle da dor durante a
circuncisão. Esse estudo foi publicado na revista Arch Pediatr Adolesc Med.
O estudo
Os autores selecionaram dois grupos de recém-nascidos. O primeiro grupo incluía
crianças com mais de uma semana de vida, as quais realizaram a circuncisão com grampo de
Mogen e foram submetidas a uma combinação de analgésicos e anestésicos. Nas crianças
desse grupo foi administrado paracetamol, 45 minutos antes da cirurgia; foi aplicada uma
camada de EMLA no local da cirurgia, 60 minutos antes do procedimento, e foi injetado
anestésico no nervo dorsal do pênis, no mesmo momento em que a pomada foi retirada, nos
10 minutos antecedentes à cirurgia. Os pacientes receberam a gaze com açúcar embebida
em suco de uva, em três momentos: enquanto aguardavam na sala de espera, antes do
bloqueio do nervo e logo antes da circuncisão.
O segundo grupo era composto por crianças com menos de uma semana, que foram operadas com
o grampo Gomco e com o uso somente da pomada de lidocaína-prilocaína no local da
cirurgia.
Todos os recém-nascidos foram filmados durante a cirurgia. O grau de dor foi medido pela
expressão facial de cada paciente. Dessa forma, foi analisada a expressão de dor
(arqueamento da testa, fechamento dos olhos e formação de sulco naso-labial) em cada
fase da cirurgia (colocação do grampo, descolamento das aderências, incisão da pele e
remoção do grampo). Outro dado analisado foi o tempo gasto com o choro durante as
diferentes fases da cirurgia e após esta.
Resultados e Conclusões
Oitenta e seis recém-nascidos participaram do estudo, sendo 57 pacientes do
grupo 1 e 29 pacientes do grupo 2. O tempo de duração da cirurgia foi muito maior nos
pacientes do grupo 2. O grau de dor foi muito menor no grupo 1, sendo que os pacientes
desse grupo choraram muito menos, 46% das crianças do grupo 1 não choraram em nenhuma
fase da cirurgia. Não houve nenhum efeito adverso nas crianças do grupo 1 e apenas uma
criança do grupo 2 teve infecção no local da cirurgia, sendo tratada com antibiótico
local.
Os autores notaram que as crianças continuaram exibindo um certo grau de resposta
dolorosa, apesar dos resultados terem evidenciado a diminuição da dor com o uso
combinado de anestésicos e analgésicos. Mas eles acreditam que essas respostas não são
causadas pela cirurgia em si, mas são decorrentes do desconforto proporcionado pela
imobilização prolongada.
Ao final do estudo, os autores concluíram que a circuncisão só deve ser realizada se
provocar a menor quantidade de dor possível, e eles acreditam que a combinação de
anestésicos e analgésicos e o uso do grampo Mogen é a melhor maneira de se alcançar
esse resultado.
Fonte: Arch Pediatr Adolesc Med 2000; 154: 620-623.
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