Artigos de saúde

Urbanização e Saúde: Questões no Terceiro Mundo

Neste Artigo:

- Introdução
- Histórico: Cidades e Saúde Pública
- Causas de Mortalidade nas Grandes Cidades
- Novos Problemas das Cidades do Século XX
- Como o Urbanismo Leva ao Aumento do Risco de Doenças?
- O Ciclo Vicioso da Pobreza
- Risco de Infecções
- Toxicidade no Ar
- Política Econômica de Globalização e Saúde Coletiva
- "Pegadas Urbanas" Ameaçando a Sustentação Ecológica Global
- Conclusão

"As cidades propiciaram o surgimento da saúde pública no começo da revolução industrial, devido aos problemas de saúde de seus moradores. Hoje, após quase duzentos anos, as cidades se encontram em número e tamanho exorbitantemente maiores. Com isso, vários problemas estão desestabilizando o equilíbrio do planeta, a começar pelas leis ecológicas.

Talvez, os problemas possam refletir a intensa desvalorização da figura humana, que passou de autor para expectador e principalmente, consumidor das atrocidades e produtos desenvolvidos para o bem estar de uma minoria. Aí se localizam os focos de batalhas entre a riqueza e a pobreza, a violência social e a crise existencial humana. Aliado a isso está a toxicidade do ar, a poluição dos rios e mares, a progressão de novas infecções e o ressurgimento de infecções antigas. Há um desequilíbrio externo fruto do desequilíbrio ideológico, político e social das classes dominantes. Existe hoje um caos que limita a saúde coletiva. São necessárias novas buscas e posturas para modificar o rumo dessa história e transformar as cidades em locais mais agradáveis de se viver e evoluir durante esse curto período de passagem pela Terra".

Introdução

Nos últimos duzentos anos, a população humana residente nas cidades aumentou de 5% para 50%. As estimativas para 2030 são de mais de dois terços da população mundial morando em centros urbanos. Tal mudança trouxe consigo várias alterações no estilo de vida, pois reflete o desenvolvimento industrial e tecnológico exponencial que parece ser a maior razão individual para o aumento dos grandes centros urbanos. Atualmente, a África é a região com menor urbanização do planeta e, ao mesmo tempo, com o maior ritmo para tal

Histórico: Cidades e Saúde Pública?

A revolução moderna de saúde pública começou nas cidades Européias do Século XIX sob as pressões da industrialização, pobreza crescente e superpopulação proporcionando uma vida urbana que se deteriorava a cada ano. Como exemplo tem-se a migração da população economicamente melhor posicionada para os subúrbios das grandes cidades inglesas, após o crescimento econômico do começo do século XIX. Por outro lado, a população mais pobre, que se manteve nos centros urbanos, foi vítima de enorme pobreza associada a doenças e superpopulação. Naquela época, a preocupação financeira de muitos políticos, representantes dessa população, impossibilitou que se aprovassem medidas de higiene pública. Somente por volta de 1866, o poder público tomou as rédeas à frente da construção de redes de esgoto e água, antes monopolizadas pelas empresas privadas.

Fazendo uma analogia com a situação acima descrita na Inglaterra, verifica-se que ainda hoje, muitos países do terceiro mundo ficam impossibilitados de tomar medidas de saúde pública em suas grandes cidades. Isso tem sido intensificado pelos interesses econômicos constantes mantidos através da pressão financeira, agora implementada pela globalização. Assim, mantém-se o ciclo do caos urbano, com moradia inadequada, pobreza, má higiene e doenças.

Causas de Mortalidade nas Grandes Cidades

Até a metade do século XX, a principal causa de morte nas regiões industrializadas era infecciosa. Entretanto, a morte por doenças infecciosas começou a diminuir na segunda metade do século XIX, devido à melhoria de fatores ambientais, assim como o aumento dos suprimentos alimentares. Outros fatores foram a melhoria das condições de moradia, da água oferecida, idéia de higiene doméstica e diminuição do analfabetismo. Alguns autores reforçam a importância das intervenções de saúde pública, incluindo engenharia sanitária e vacinação.

Novos Problemas das Cidades do Século XX

Ao mesmo tempo em que a industrialização se intensificava, a poluição do ar também o fazia. Episódios de intensa poluição aérea ocorreram na Europa e América do Norte na metade do século XX, como exemplo, o grande fog de Londres em 1952. Com isso, houve o advento de legislações que diminuíram a propagação de partículas pesadas como dióxido sulfúrico. No entanto, aumentou a concentração de gás carbônico e outras partículas menores. Outros poluentes em ascensão são os lixos derivados de diversos produtos de consumo. Nos centros urbanos dos países do terceiro mundo, não tem ocorrido essa inversão de problemas, mantendo-se com freqüência, ambos os quadros de poluição. Cidades como a Cidade do México, São Paulo e Nova Deli têm uma atmosfera poluída aliada a uma má qualidade da água e esgoto quando avaliadas em relação à população como um todo.

As três formas principais pelas quais o ambiente urbano afeta a saúde são através das mudanças sociais que acompanham o urbanismo, modificando comportamentos de risco, o risco proporcionado pela urbanização através de novos agentes tóxicos e infecciosos e pelo impacto, em grande escala, no ecossistema da biosfera, levando ao desequilíbrio ecológico.

Como o Urbanismo Leva ao Aumento de Risco de Doenças?

As cidades são consideradas locais com altos índices de tabagismo, acidentes automobilísticos e obesidade. Esse último fator é proporcionado pela discrepância entre o acúmulo energético alto (alimentos ricos em energia e pouco nutritivos) e o gasto energético baixo (ausência de atividades físicas rotineiras) devido aos tipos de ocupações profissionais que não exigem um alto gasto energético. Assim, a obesidade leva a condições predisponentes a diversos tipos de doenças (hipertensão arterial e diabetes tipo II, por exemplo). O surgimento da AIDS deveu-se muito ao novo tipo de comportamento humano iniciado nos anos 80: liberação sexual, uso de drogas ilícitas e maior facilidade de locomoção a longas distâncias. O índice de intoxicações alimentares também tem crescido muito nos últimos anos.

Dentre os pontos positivos da vida urbana está o acesso fácil à assistência de saúde, à educação e aos serviços sociais. Há uma gama enorme de facilidades e novas oportunidades a cada momento. A mobilidade individual e familiar torna fácil conseguir interromper relacionamentos desagradáveis, no entanto, a vida nas cidades pode ser muitas vezes impessoal, alienante e violenta.

O Ciclo Vicioso da Pobreza

No terceiro mundo há uma grande diferença entre a população pobre e a de bom poder aquisitivo no que se refere à mortalidade infantil, às doenças infecciosas como tuberculose e cólera e a exposição à poluição aérea. Problemas psicossocias também estão relacionados com depressão, alcoolismo, uso de drogas ilícitas, suicídio, violência e homicídios. Nas cidades grandes é sempre a população carente que é vítima de assaltos, estupros e assassinatos. Por outro lado, os ricos contratam seguranças. A violência e vulnerabilidade dos pobres aumentam devido à crescente ausência de oportunidades de emprego. A pobreza, dessa forma, torna-se muito mais que a simples ausência de renda. A miséria urbana é o mais importante fator de risco ambiental de saúde, quando está associada com ausência de bens físicos, influência política e acesso a serviços sociais básicos. Mesmo com os progressos em moradia, em algumas cidades, desde 1990, há um crescimento contínuo do número de pessoas expostas a riscos urbanos. Os governos usualmente se esquecem que uma importante contribuição para diminuição da pobreza é a produção de obras de moradia e saneamento básico.

Riscos de Infecções

As cidades estão se tornando verdadeiras portas de infecção. A mobilidade populacional em larga escala tem possibilitado o surgimento de novos microorganismos e o retorno de organismos anteriormente controlados. Alguns exemplos de doenças: esquistossomose (surtos na África do Sul), elefantíase (surtos em Recife), febre amarela, cólera e leishmaniose.

Tem havido certa preocupação com a possibilidade de um aumento de doenças transmitidas por mosquitos devido ao aquecimento da Terra, que por sua vez levaria a chuvas em locais incomuns, levando ao acúmulo de água, favorecendo a procriação desses insetos. Um ótimo exemplo é a Dengue, que se tornou a mais comum doença urbana transmitida por mosquitos.

Toxicidade no Ar

Industrialização + superpopulação + produção de lixo + sistemas de transportes pesados: isso leva a doenças facilmente perceptíveis quais sejam os traumatismos corporais por acidentes e a asma. E o que é imperceptível?

Exposição ao chumbo: em 1997, o Banco Mundial colocou dentre os 10 objetivos prioritários a retirada do chumbo do petróleo. O chumbo tem sido utilizado por décadas sendo proveniente de emissões industriais, tintas e combustíveis. Ele causa intoxicação em crianças alterando seu estado neurológico e diminuindo seu nível de inteligência. Apesar dos países ricos já terem diminuído sua emissão, os países pobres ainda mantêm altas taxas no ar.

Poluição pelo Tráfego: Existem mais de 750 milhões de carros em todo mundo. Problemas: acidentes – 750.000 mortes anualmente; poluição aérea – problemas respiratórios; chuva ácida e acúmulo global de gás carbônico.

Ondas de calor: sua freqüência irá aumentar devido ao aumento da temperatura terrestre. Seu impacto na mortalidade é maior no centro de grandes cidades onde a temperatura tende a ser mais alta durante o dia e à noite. Esse efeito tipo "ilha de calor" é causado pela presença de estruturas que retém calor como concreto e asfalto e pela obstrução de brisa e ventos pelas construções. A população mais vulnerável é a de idosos, enfermos e pobres.

Política Econômica da Globalização e Saúde Coletiva

A globalização levou a instalação de grandes fábricas de produtos altamente industrializados (eletroeletrônica, carros) em países onde a mão de obra é mais barata. Os países pobres tentam, por outro lado, exportar tais produtos, como fonte de acúmulo de riquezas, mantendo baixas as taxas de inflação no "mundo rico" devido ao baixo preço dos produtos. Há duas conseqüências principais para os países pobres nessa prática. Primeiro há uma estratificação socio-econômica gerada por forças internacionais. Os países que trabalham com o turismo têm uma renda boa, os que detêm empresas exportadoras, um salário razoável e os menos producentes, (rurais) sofrem. Muitas comunidades rurais se tornam marginalizadas. Esses locais sofrem de pobreza crescente, falta de alimentos, desnutrição infantil e aumento do risco de doenças infecciosas. Em segundo lugar, a queda de preços das mercadorias manufaturadas, exportadas num mercado competitivo, onde acordos leais entre governos e empresas não mais ocorrem, levando à manutenção da pobreza. O crescimento de favelas e guetos dentro e fora das cidades é um reflexo de todas essas iniqüidades. Em todo mundo, os residentes pobres das grandes cidades pagam o preço através das diversas alterações em sua saúde. Atividades industriais são geralmente concentradas em regiões mais pobres onde as legislações sobre poluição ambiental são menos rigorosas.

"Pegadas Ecológicas" Urbanas Ameaçando a Sustentação Ecológica Global

As populações urbanas têm um papel dominante como agente de pressão sobre o ecossistema. As cidades foram consideradas por um autor como vastos processadores de alimentos, combustíveis e outras matérias primas. São como organismos imensos sem precedentes na história, dessa forma, tendo "pegadas ecológicas" cada vez maiores. Os benefícios ecológicos da urbanização incluem a reciclagem de materiais. Entretanto, os custos ecológicos e sociais de uma gama de produtos não são repassados nos preços finais - madeira, petróleo, metais - produtos dos quais as populações são extremamente dependentes. Elas dependem de áreas fornecedoras maiores que suas próprias cidades. Como exemplo, o antigo império Romano necessitava de 1.000 toneladas de grãos diários da África do Norte e os holandeses, atualmente, consomem riquezas naturais de uma área 15 vezes maior que o seu país.

As cidades possuem uma função ativa na modificação dos sistemas de reciclagem naturais que mantêm o ecossistema em equilíbrio através dos ciclos biológicos, limpeza das águas e ar e reciclagem de nutrientes. Enquanto antigamente tais funções não eram valorizadas devido ao pequeno número de habitantes terrestres, hoje, está havendo mudanças de tal ordem que a população mundial corre o risco de vários problemas de saúde. A mudança mais radical até o momento tem sido no clima, com o aumento da temperatura do planeta. O mundo urbanizado (um quinto da população mundial) contribui com três quartos das emissões de gases poluentes na atmosfera. Como conseqüência da mudança climática haverá diminuição de alimentos, de água potável, e do controle de infecções.

Conclusão

Algumas propostas e idéias de soluções para todos esses problemas expostos acima seriam: aumentar o grau de educação e treinamento das populações; transferência internacional de tecnologia; aumento do papel do estado como uma instituição moderna, honesta e eficiente; alívio das dívidas de países pobres e um compromisso sério de consumo de reservas naturais em todo o planeta.

Avançando no século XXI, deverão ser modificadas as formas de cidades hoje em dia expostas. As pessoas devem ir morar em áreas de habitação separadas por grandes parques verdes, interligadas por transportes coletivos de alta tecnologia como trens modernos. Novas tecnologias limpas serão utilizadas e, mais importante, ainda, políticas de eqüidade social e ecológica serão pesquisadas cada vez mais.

Assim as cidades poderão passar de zonas focais de grandes distúrbios sociais, políticos, econômicos e ecológicos, para serem locais de crescimento cultural e de compartilhamento de ideais tanto ecológicas quanto tecnológicas, essa parece ser a única forma de nossa sobrevivência futura.

Copyright © 2006 Bibliomed, Inc.           05 de Junho de 2006.