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Malária

© Equipe Editorial Bibliomed

Neste artigo:

- Introdução
- Sintomas
- Tratamento
- Referências

Introdução

A malária é causada por protozoários parasitas do gênero Plasmodium, os quais são transmitidos aos humanos pelas fêmeas dos mosquitos anofelinos. Os plasmódios adaptaram-se a diversos hospedeiros, desde répteis a mamíferos. A primeira descrição de malária, em humanos, data do período entre 25 anos antes de Cristo a 54 anos depois de Cristo, com relato de febre com periodicidade terçã e quartã.

Atualmente, são reconhecidas cinco espécies causadoras de malária, em humanos. Porém, a maioria dos casos é causada por duas delas, a P. falciparum e a P. vivax. Em todo o mundo, estima-se que centenas de milhares de infecções ocorram anualmente, e o impacto histórico da doença ocasionou alterações genômicas por meio de pressão evolutiva sobre os genes envolvidos na estrutura e no metabolismo das hemácias humanas. A mortalidade por malária ainda é significativa, com aproximadamente 2.000 mortes por dia no mundo. Mais recentemente, tem-se reconhecido que a malária possa ser responsável, indiretamente, por mais da metade de todas as infecções bacterianas invasivas em cenários de alta transmissão.

A infecção era disseminada, até algumas décadas atrás. Na década de 50, a doença foi considerada erradicada nos EUA e a partir de 1955 foi lançada a campanha para erradicação global da doença, levando à eliminação da transmissão em diversos países. Infelizmente, isso não aconteceu na África sub-Sahariana e nem no sul da Ásia.

Sintomas

Os sintomas mais comuns da malária são:

  • Calafrios
  • Febre alta
  • Dores de cabeça e musculares
  • Taquicardia
  • Aumento do baço
  • Delírios (em raros casos)

Os sintomas menos comuns da malária são:

  • Rigidez na nuca
  • Perturbações sensoriais
  • Desorientação
  • Sonolência ou excitação
  • Convulsões
  • Vômitos
  • Dores de cabeça
  • Casos letais da malária (malária cerebral) são, geralmente, causadas por P. falciparum

Tratamento

O manejo dos pacientes com malária depende da espécie envolvida. No caso em que a espécie não esteja definida, recomenda-se que o tratamento seja realizado como se a infecção fosse devida ao P. falciparum, até que a confirmação seja obtida. De qualquer forma, o tratamento deve, preferencialmente, ser conduzido por especialista com experiência no tratamento da malária.

O tratamento medicamentoso sofreu uma significativa transformação após a introdução dos esquemas contendo artemisinina (ACTs). Seu mecanismo de ação não é totalmente conhecido, mas sabe-se que essa droga atua em todos os estádios do ciclo eritrocítico do plasmódio, levando a redução rápida da parasitemia. Além disso, é capaz de eliminar formas precoces e prevenir o desenvolvimento de trofozoítos mais maduros e esquizontes, que causam doença grave.

1. Malária por P. falciparum

Essa infecção pode ser definida como grave ou não-grave (ou complicada e não complicada), com base na presença de pelo menos um critério de gravidade pela Organização Mundial de Saúde (OMS): rebaixamento do nível de consciência, prostração, crises convulsivas, desconforto respiratório, choque circulatório, icterícia associada a outra disfunção de órgão vital, sangramento anormal, hemoglobinúria, acidose metabólica, hipoglicemia, anemia grave (Hb < 5 g/dL), insuficiência renal e hiperparasitemia.

1.1. Infecção Não-Grave

As recomendações de tratamento da malária não-grave variam entre os países. Segundo as recomendações do Centers for Disease Control (CDC), dos EUA, e do Reino Unido, o tratamento deve ser iniciado após a confirmação laboratorial, exceto em situações especiais. Logo após o diagnóstico, o tratamento deve ser iniciado prontamente, mesmo que não seja o de primeira escolha. Uma vez disponibilizada a terapia ideal, o tratamento pode ser modificado. A OMS recomenda empregar ACTs como primeira linha de tratamento, existindo cinco opções de esquemas:

• Artemether/Lumefantrina
• Artesunato/Amodiaquina
• Artesunato/Mefloquina
• Artesunato/Sulfadoxina-Pirimetamina
• Dihidroartemisina/Piperaquina

Já o CDC recomenda o emprego da cloroquina nos casos de doença adquirida em regiões nas quais o P. falciparum seja sensível. Se o padrão de resistência não for conhecido, sugere-se o uso de atovaquona-proguanil, artemether-lumefantrina ou quinina mais doxiciclina/tetraciclina/clindamicina, reservando-se a mefloquina apenas para os casos nos quais as demais drogas não puderem ser usadas.

O CDC e o consenso do Reino Unido recomenda que todos os pacientes com malária por P. falciparum sejam hospitalizados para monitoração da resposta ao tratamento e observação de possível progressão, devido à mortalidade significativa mesmo em pacientes jovens e previamente saudáveis, que podem apresentar deterioração rápida. O tratamento ambulatorial deve ser considerado para pacientes selecionados e tratados em centros com experiência no manejo da malária.

1.2. Infecção Grave

Dois grandes estudos conduzidos na Ásia e na África mostraram a superioridade do artesunato em comparação ao quinino, no tratamento da malária grave. Uma revisão recente mostrou redução de quase 40% no risco de morte em adultos com malária grave tratados com artesunato, em comparação ao quinino, sendo a redução de 24% em crianças.

A despeito desses resultados, ainda existem dúvidas quanto à indicação do artesunato como primeira escolha no tratamento de malária dita "importada" de outro país. Diversos questionamentos quanto à metodologia desses estudos e relatos mais recentes de eventos adversos não previstos com o artesunato levam a dúvidas quanto ao tratamento de primeira linha da malária do viajante com essa droga. Porém, as evidências disponíveis apontam claramente a superioridade do artesunato no tratamento da malária grave. O ponto chave do tratamento é a administração imediata do tratamento e, assim que o paciente tolere, deve-se adicionar um segundo agente ao escolhido para primeira linha.

Por se tratar de condição ameaçadora à vida, a malária grave deve ser manejada por profissionais experientes e em um contexto apropriado. O cuidado de suporte é o mesmo empregado para outros processos infecciosos graves, embora ainda não existam evidências diretas do benefício da abordagem guiada por objetivos, na sepse. Existem dúvidas quanto ao manejo da hidratação venosa desses pacientes, e um estudo randomizado mostrou que, em crianças com infecção grave e sinais de hipoperfusão, a fluidoterapia foi associada a aumento da mortalidade. No entanto, 60% dessas crianças apresentavam infecção por P. falciparum e os resultados desse grupo foram semelhantes aos das crianças sem malária.

O consenso do Reino Unido sugere que a pressão venosa central seja monitorada, mantendo-se uma pressão atrial direita inferior a 10 cmH2O, enquanto a OMS recomenda manter essa pressão entre 0-5 cmH2O. Porém, evidências mais recentes questionam se a manutenção desses valores seria capaz de manter a perfusão, devendo-se evitar hidratação com grande volume. Atenção deve ser prestada à existência de coinfecção bacteriana, nos pacientes com malária grave, uma ocorrência que não é incomum. Hemoculturas devem ser realizadas para todos os pacientes.

A glicemia deve ser acompanhada cuidadosamente, pois derivados de quinino estão associados a hipoglicemia, o que é menos comum com o artesunato. A administração de quinina e quinidina deve ser feita por infusão controlada, pelo risco de hipotensão grave e fatal; além disso, devem ser submetidos a monitorização eletrocardiográfica, pelo risco de prolongamento do intervalo QT.

1.3. Terapias Adjuvantes

Diversos agentes adjuvantes foram testados na tentativa de reduzir a mortalidade associada à malária, incluindo corticosteróides, anticorpos contra o fator de necrose tumoral alfa (TNF-a), pentoxifilina, desferroxamina, n-acetilcisteína, heparina, aspirina e manitol. Porém, nenhum estudo conseguiu demonstrar benefício em termos de mortalidade para tais terapias.

A exsanguineotransfusão atualmente encontra-se recomendada nos casos de parasitemia superior a 10%, malária cerebral, síndrome do desconforto respiratório ou complicações renais, segundo o CDC. Não existem evidências fortes que dêem suporte ao uso da exsanguineotransfusão, sendo sua indicação baseada principalmente em relatos e séries de casos.

2. Malária Não-Falciparum

O tratamento da malária por P. vivax ou P. ovale divide-se em manejo do quadro febril agudo e no manejo de hipnozoítos para prevenção de recaídas. O P. malariae e o P. knowlesi não apresentam estádio de hipnozoítos, e o tratamento voltado para a fase aguda já é suficiente.

O tratamento agudo é realizado com a cloroquina, normalmente na dose inicial de 600 mg, seguido de 300 mg de 6-8 horas depois e 300 mg nos dias 2 e 3. No caso de doença grave e na ausência de cloroquina injetável, pode-se empregar quinina, quinidina ou artesunato, nas mesmas doses empregadas no tratamento da malária grave por P. falciparum.

O medicamento aprovado para abordagem dos hipnozoítos é a primaquina. Lembrar que os pacientes com deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase podem apresentar hemólise grave quando tratados com primaquina e seu composto relacionado, a tafenoquina. Nesse contexto, a cloroquina pode ser administrada semanalmente como profilaxia por seis meses.

Referências

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